No próximo dia 17, como ocorre todos os anos, na terceira quinta-feira do mês de Novembro, é comemorado o Dia Mundial da Filosofia, evento estabelecido pela UNESCO com o objetivo de promover a importância da reflexão filosófica e estimular a troca de experiências entre diferentes países, culturas, religiões, raças, formas de pensar e de viver.
A UNESCO considera que a Filosofia provê as bases conceituais dos princípios e valores dos quais depende a convivência harmônica entre os povos. Neste dia, diferentes tipos de organizações, grupos comunitários, universidades e agências de governo, em diversos países, promovem eventos para discutir e inspirar o debate público sobre os desafios enfrentados pela sociedade em todo o mundo. A humanidade, com suas variadas formas de expressão cultural, necessita sempre encontrar respostas apropriadas que possibilitem a paz entre os seres humanos, respeitando suas diferenças. O fanatismo, o sectarismo e toda forma de radicalismo político, religioso, artístico e científico impede o diálogo construtivo, única forma pacífica de promover a convivência harmônica da humanidade. Várias guerras, guerrilhas e convulsões sociais, onde inúmeras vidas foram ceifadas de forma violenta, decorreram de posições radicais que tentaram se impor pela violência, rejeitando o diálogo.
Observando a história, podemos constatar, em todos os tempos, o importante papel desempenhado pela Filosofia na determinação de caminhos renovadores em épocas difíceis, onde o fanatismo de todos os tipos impedia a convivência e o desenvolvimento da humanidade. No final da Idade Média, por exemplo, o pensamento clássico, especialmente de Platão e de Aristóteles, foi fundamental para o Renascimento, resgatando a Europa de quase mil anos de obscurantismo social, político, religioso e científico.
Hoje, a humanidade necessita novamente de respostas inovadoras. Tensões perigosas entre diferentes facções preocupam a todos. Grupos religiosos fanáticos promovem o terrorismo internacional. Manifestações de discriminações sociais e raciais estão cada vez mais frequentes, especialmente nos países considerados desenvolvidos. Recursos naturais, como água potável, petróleo, insumos agrícolas indispensáveis, entre outros, estão cada vez mais escassos. O desequilíbrio ecológico e a poluição estão promovendo mudanças radicais de clima e de condições atmosféricas, com consequências imprevisíveis. Os países desenvolvidos, considerados ricos, que em tese estariam em melhores condições de apresentarem soluções para esses problemas, estão passando por séria crise econômica, sendo obrigados a se voltarem para os próprios problemas, na tentativa de salvarem a própria pele. Tudo indica que necessitamos, mais uma vez, encontrar um novo direcionamento para a humanidade. Novamente, nada melhor do que buscar o amparo da Filosofia.
Nova Acrópole, escola de filosofia à maneira clássica com sede em mais de 50 países, se une às demais instituições no apoio a esta iniciativa da UNESCO na promoção desse diálogo filosófico. No Brasil, Nova Acrópole promoverá, no dia 19 de novembro, diversos debates, em suas mais de 80 filiais, tendo, como tema estimulador do diálogo, o Mito de Prometeu.
Prometeu foi quem, dentro da Mitologia Grega, roubou o fogo sagrado dos deuses e entregou-o aos homens. O fogo sagrado significa a capacidade de pensar e poder prever o futuro. Prometeu é aquele que vê antes, porque é capaz de imaginar o futuro. Mas, estando ainda o homem muito dominado pelas próprias paixões, essa capacidade de pensar foi colocada a serviço de seus instintos. Utilizando o pensamento e a imaginação, ele articula as situações em benefício próprio, impondo a lei do mais forte, gerando a injustiça e o desequilíbrio social, espalhando, consequentemente, o mal pelo mundo. É por isso que, no Mito de Prometeu, aparece Pandora, a linda mulher que abre a caixa onde estavam todos os males que afetam a humanidade; mas, em seguida, ao fechar rapidamente a caixa, permanece dentro da mesma a Esperança.
Prometeu foi castigado por Zeus pela sua imprudência, ficando acorrentado entre os homens, sofrendo as mesmas paixões que cegam e afligem a todos.
Finalmente, é libertado por Heracles, o herói humano que vence todas as provas e, por último, liberta Prometeu, devolvendo a esperança à humanidade. Se ele o fez, significa que todo homem pode conseguir.
O Mito de Prometeu, como todo Mito, não se desgasta com o tempo, é atemporal. O homem continua, hoje, colocando sua capacidade de pensar, prever e imaginar em benefício de poucos. A motivação para criar e produzir sustenta-se, como no reino animal, na livre competição, que é um direito constitucionalmente garantido na maioria dos países que se dizem “civilizados”. A bondade, que se expressa através da generosidade e colaboração, virtude natural do ser humano, está adormecida pela crença antinatural na competição, o motor da criatividade e produção. Antinatural porque ninguém, em sã consciência, considera bom o seu vizinho porque ele é altamente competitivo na utilização dos recursos naturais da região onde vivem, ficando com tudo para ele. Pelo contrário, todo ser humano considera como bom o vizinho generoso e colaborador.
Se o homem não é generoso, se não colabora com os demais, não é bom, embora possa ter todas as outras qualidades humanas. Como dizia Platão, o homem que não coloca suas qualidades a serviço dos demais se torna socialmente perigoso e, nesse caso, quanto mais qualidades tem, pior se torna. É sempre preferível um bandido sem qualidade que um bandido qualificado. O raciocínio rápido, a capacidade de trabalho, a saúde, a riqueza etc., sem a virtude da bondade e generosidade, tornam o egoísta competitivo um perigo para a sociedade.
Essa reflexão sobre o mito de Prometeu é um exemplo do tipo de debate que Nova Acrópole está propondo para o Dia Mundial da Filosofia, colaborando com a iniciativa da UNESCO de promoção da reflexão filosófica na busca de alternativas para alicerçar um mundo novo e melhor, pois o atual já está mostrando sintomas claros de desgaste. Prometeu continua acorrentado, necessitando de muitos Héracles.
Luis Carlos Marques Fonseca, presidente nacional de Nova Acrópole.