As relações humanas são fontes de dores e prazer para nós: a convivência é difícil para todo mundo, é um desafio poder se relacionar. A filosofia por trás de Confúcio nos mostra como é possível construirmos pontes em vez de muros, harmonizando nossas relações e tornado a convivência uma experiência evolutiva.
Confúcio nasceu na província de Lu, no ano de 551 a.C., e deixou uma filosofia voltada para a civilidade, tratando sobre os protocolos nos relacionamentos humanos. Ele partiu da mentalidade clássica chinesa que ele resgatou em seu período histórico, marcado por muitos combates e divisões.
Confúcio ensinava que o ser humano deveria viver para cumprir o seu papel no mundo concreto a fim de estabelecer e refletir a ordem cósmica, a fim de poder espelhar o céu. Todos nós temos o nosso papel, e quando conseguimos cumpri-lo bem, reproduzimos essa ordem cósmica na Terra.
Conseguimos isso por meio do tom cerimonial com que tratamos todas as coisas da vida: a palavra certa, o tratamento adequado, a forma com que nos dirigimos às pessoas à nossa volta – para tudo existe um protocolo mais justo. Cada uma das nossas relações exige uma postura interna diferente, e à medida que o ser humano vai se aperfeiçoando, ordenando seus pensamentos e emoções, ele faz com o que esse ordenamento interno se reflita nas relações sociais.
Segundo Confúcio, o homem com autoconhecimento consegue se identificar com o que lhe é próprio e harmoniza as relações com os demais. Há que se ter vida interior. Vida que se produz dentro de nós e nos conecta com o Divino, com Deus. “Quanto mais vida interior, mais sensibilidade para lidar com os demais”, é uma das lições que podemos tirar da filosofia de Confúcio.
Alguns ensinamentos práticos para se viver e aplicar a filosofia de Confúcio são:
Respeito: a reverência em relação ao que é superior, assumindo uma postura de humildade e delicadeza para reconhecer o que há de nobre em cada pessoa ou ser;
Preservar a individualidade: cada um tem sua natureza e por isso precisa de seu espaço para cultivar a vida interior e poder estar só. Para poder conviver e estar bem com os demais, precisamos trabalhar a dignidade e valor próprios, o que nos torna fortes por dentro. Desta forma, nos tornamos flexíveis porque sabemos quem somos;
Conhecer o ser humano: observando as pessoas em suas ações podemos conhecê-las e saber que as pessoas “são o que são”, sem a projeção de nossas expectativas. Há que se ter coragem de conhecer a si mesmo e saber quem somos com nossas limitações, virtudes e possibilidades. “A virtude da humanidade consiste em amar os homens; a prudência, em conhecê-los.” (Confúcio);
Cortesia e etiqueta em todos os planos: não basta ter boas maneiras, se essa atitude não corresponde ao que somos de verdade. Refinamento interno que se reflita em cortesia externa. Cultivar a cortesia e a gentileza interior para que possa se refletir com todos e em todas as situações;
Lealdade: a verdade bem colocada ajuda o outro a crescer. A verdade na justa medida e na forma adequada e educada contribui para a relação entre quem fala e para quem é dito;
Benevolência: agir com empatia e bondade; ofertar aos demais o que temos de melhor. Isso nos torna fortes e melhores porque desenvolvemos uma coluna de integridade;
Influência e sensibilidade: nosso jeito de ser e agir influencia o outro. Quando agitados, podemos agitar o outro, e quando nos aproximamos com serenidade, promovemos no outro esse estado de ser e estar. Vivemos em uma cultura onde tudo tem que ser muito rápido e direto. Falta-nos a sensibilidade para levar a palavra certa à pessoa que necessita;
Ritos e música para promover a harmonia: as ondas produzidas pelas músicas podem nos harmonizar ou agitar. Buscar ouvir músicas que me traga ritmos que me regulam e ordenam. Os ritos respeitam às leis e princípios universais e nos ajudam a agir com consciência. Fazer as coisas, mesmo cotidianas, com mais presença e atribuindo valor ao que nos propomos realizar. Levar a vida como um grande ato sagrado;
Sobriedade: estar em si mesmo, sentir de forma mais profunda evitando a superficialidade. Um exemplo é dedicar uma tarde a um amigo ao invés de poucas horas a milhares de “amigos” nas redes sociais. Ter a oportunidade de aprofundar as nossas relações.
O ser humano que governa a si mesmo encontra seu ponto alto e se conecta com o que tem de mais elevado e profundo, sendo capaz de harmonizar com os demais porque compreende a vida e a natureza humana. Essa é a nobreza da convivência.
Melissa Andrade Costa
Diretora voluntária da Nova Acrópole do Lago Sul, Secretária de Relações Institucionais de Nova Acrópole no Brasil e instrutora do curso de Filosofia à Maneira Clássica. Realiza palestras e cursos na área de Filosofia Aplicada e conduz voluntários para promover a Filosofia como Arte de Viver. Possui mestrado pela London School of Economics na área de Política Social e avalia projetos das Nações Unidas de abrangência nacional, regional e global para diversas agências na África, América Latina e Ásia.