O Planeta Terra como um Ser Vivo

Se perguntássemos se o ser humano é um ser vivo, essa pergunta pareceria absurda. No entanto, quando olhamos para o Sol, para a Terra e para outros planetas, para coisas que não podemos ver ou para objetos que são inanimados, não os julgamos como seres vivos. A verdade é que buscamos, nesse conceito de “ser vivo”, algo que seja nossa semelhança. Nos é estranho ver um planeta como um ser sensível, capaz de se autorregular e que possui sua própria ideia, seu próprio processo evolutivo.

Nesse período em que nos aproximamos do Dia Internacional da Mãe Terra, 22 de abril, data instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), vale repensar a forma como vemos o planeta que habitamos e nosso compromisso com sua integridade.

Quando fazemos um estudo comparado de antigas civilizações, como a grega, romana, asteca, maia, chinesa e japonesa, por exemplo, percebemos que pensavam de forma diferente. Para elas, o planeta Terra era um ser vivo e havia uma profunda relação entre os seres. Todas viam o planeta como essa Grande Mãe, que para os gregos se chamava Gaia ou Gea, a matéria primordial que possibilita toda a vida, nutridora de todos os nossos benefícios, aquela que nos empresta seus elementos, seus átomos e moléculas para a nossa vida e, quando morremos, os toma de volta. Nada se perde, tudo se transforma e participa de um ciclo. Assim, todos se viam como filhos da Terra.

Em algum momento da história, nos convertemos de filhos da Terra para os donos da Terra, onde tudo existe para o nosso uso e não mais como participantes de uma unidade. Pensamento esse que nos leva a uma pergunta: se continuarmos com o mesmo modo de vida, o que pode acontecer com o planeta?

Hoje, a população humana é de 8 bilhões de pessoas e, até 2030, deve chegar a 10 bilhões. Então, além dos problemas climáticos, o mundo se preocupa com a segurança alimentar de todos.

Um dos cientistas das mudanças climáticas, James Lovelock, nos anos 80, lançou a hipótese Gaia, que descreve o planeta como um grande ser vivo, pois é capaz de se autorregular. A teoria teve suas críticas — e talvez ainda as tenha —, mas com o decorrer do tempo foi aceita pela área da ecologia.

A capacidade de se autorregular é própria dos seres vivos. Nosso próprio corpo tem uma série de parâmetros que ele deve manter. No caso de uma doença, por exemplo, é capaz de aumentar as células de defesa para atuarem rapidamente, ou, em um dia de calor, nosso corpo ativa mecanismos para perda de calor, como o suor. Cito estes exemplos da vida humana pois são mais conhecidos por nós. Os filósofos gregos e do Egito diziam que existe uma correspondência entre o macro e o micro, e que o ser humano é um pequeno cosmos. Nesta concepção, o planeta demonstra, por correspondência à vida humana, as mesmas características.

Ao olhar para a natureza, percebemos como tudo está conectado e participa de uma ordem que gera harmonia. Em um ambiente natural, percebemos como ele é rico em diversidade. A humanidade pode aprender muito com isso: saber que cada um de nós tem algo a realizar, colaborar com a vida. Esta harmonia necessita das diferenças, pois só assim podem se complementar. O resultado dessa harmonia nas relações humanas seria a fraternidade.

Mas unidade não se faz apenas juntando coisas, e sim conectando as coisas e as relações mediante um propósito, um grande ideal. Assim, a filosofia pode nos ajudar a construir novamente um grande ideal de humanidade que busque esta harmonia.

Na filosofia, refletimos que tudo está regido por uma lei de causa e efeito — uma lei especial onde toda ação possui sua reação, todos os efeitos possuem suas causas — e que se aplica a todos os seres.

No organismo humano, se vivemos de acordo com maus hábitos, o efeito esperado é uma doença. Observando os fatores climáticos, falamos em catástrofes — e estas são efeitos de algo — mas não buscamos as causas que podem tê-las gerado. Atuamos sempre nos efeitos, e estes efeitos vêm se ampliando.

A verdade é que a humanidade já causou muito dano ao meio ambiente pela sua visão utilitarista e materialista. E até pensamos: isso vai ter consequências? Sim ou não? Pois estas consequências são hipóteses para a ciência, e por haver o “talvez não”, ou por esta resposta pertencer ao futuro, deixamos para depois, para as próximas gerações. E isso é uma irresponsabilidade.

Se conseguirmos ver o planeta como um grande ser vivo, e que nossa forma de vida o impacta diretamente, o ser humano, que possui essa condição de compreender a si mesmo e seu entorno, deve utilizar seu discernimento e inteligência para atuar com bondade, pois possui uma grande responsabilidade e deve buscar respostas para contribuir com a vida do planeta e de todos os seres.

Os países buscam soluções para os efeitos climáticos, fazem acordos para redução de gases de efeito estufa, promovem mecanismos de desenvolvimento limpo, reflorestam áreas desmatadas para absorver o carbono da atmosfera — e tudo isso é válido, ainda que ocorra com grande dificuldade. Mas será que estamos atuando nas causas do problema?

É necessário, além destas metas, atuar na construção de um ideal que contemple todo o planeta: uma mentalidade colaborativa e não apenas utilitarista, uma mentalidade de respeito e unidade.

* Felipe Guilherme Klein – Engenheiro Agrônomo, servidor público da Secretaria de Meio Ambiente de Mato Grosso, Filósofo e professor voluntário da Nova Acrópole há 11 anos

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